José Manuel Viegas
O Professor José Manuel Viegas foi Professor Catedrático de Transportes no IST desde Novembro de 1992. Vinte anos mais tarde, em Novembro de 2012, pouco depois de ter iniciado o seu mandato de 5 anos como Secretário-Geral do Fórum Internacional dos Transportes, na OCDE, passou à situação de Professor Catedrático aposentado do IST.
O Prof. José Manuel Viegas foi o primeiro investigador científico no domínio dos Sistemas de Transportes em Portugal, tendo sido o promotor ou criador da maior parte das primeiras (e ainda principais) estruturas de ensino avançado e de investigação nesse domínio em Portugal.
Começou por propor em 1986 a criação do Mestrado em Transportes, quando era Professor Auxiliar de Urbanização, sendo o Coordenador deste programa até 2002. Este foi um dos primeiros cursos de Mestrado do IST tendo a sua aprovação para início no ano letivo 1987/88 sido obtida na condição de "não gerar encargos adicionais para a escola", tal como sucedeu com os poucos mestrados contemporâneos. Como era inevitável face à inexistência de docentes qualificados no IST para a maior parte das unidades curriculares, a docência deste Mestrado recorreu bastante, ao longo da sua primeira década, a professores de universidades estrangeiras e a especialistas nacionais, sempre com financiamento assegurado pelos projetos do Prof. José Manuel Viegas.
Em 1994 conseguiu criar o TRANS-POR, Fundo para o desenvolvimento do Ensino Superior e Investigação em Sistemas de Transportes em Portugal, financiado por 8 empresas do sector dos transportes (4 do setor público e 4 do setor privado), com um capital de 120 mil contos, subscrito ao longo de 3 anos. Esse fundo revelou-se especialmente importante no apoio à participação de docentes estrangeiros e na atribuição de bolsas a investigadores e alunos.
Como o enquadramento "sem encargos adicionais para a escola" não permitia creditar aos docentes as horas lecionadas no mestrado (durante quase uma década desde a sua criação), e porque a única unidade curricular deste domínio no tronco comum das licenciaturas de Engenharia Civil e de Engenharia do Território era Vias de Comunicação, a dimensão do grupo docente de Vias de Comunicação e Transportes à data da assunção da cátedra de Transportes pelo Prof. José Manuel Viegas era de apenas 2.5 ETI, incluindo ele próprio.
Conseguir maior dimensão para o grupo não parecia viável pela via do ensino, mas também pela via dos projetos de investigação nacionais (da JNICT) havia uma grande dificuldade, porque não havia uma área científica de Transportes nem este domínio estava explicitamente mencionado em qualquer das áreas científicas definidas, pelo que qualquer projeto proposto em Sistemas de Transportes (eminentemente interdisciplinar) era apreciado em sequência (variável consoante o título do projeto) pelos painéis de engenharia, urbanismo e arquitetura, economia, e geografia, obtendo de cada um destes painéis notações do estilo "parece muito interessante mas não se enquadra nas prioridades deste domínio", não sendo por isso selecionado para financiamento.
Face a esta quase impossibilidade de aquisição de projetos de investigação e de contratação, quer de docentes quer de investigadores, o Prof. José Manuel Viegas optou por um caminho heterodoxo para a criação dum grupo de investigação em Sistemas de Transportes: enquanto acionista e administrador-delegado da empresa de consultoria TIS - Transportes, Inovação e Sistemas, fundada em 1992 dedicou uma parte dos recursos da empresa à participação nos projetos de l&D da Comissão Europeia, o que permitiria uma valorização rápida dos técnicos da empresa e a geração de uma reputação favorável no mercado nacional da consultoria, sem exigir financiamento adicional. Durante vários anos a TIS foi uma das principais entidades contratadas pela Comissão Europeia no domínio dos Transportes, sistematicamente nos primeiros 3 lugares a nível europeu. A equipa envolvida nestes projetos chegou a atingir cerca de uma dezena de técnicos de várias formações. O reconhecimento dos Transportes como uma área científica em Portugal (pela FCT, sucessora da JNICT em 1997) só! ocorre em 2003 e terá tido a ver com esse sucesso a nível europeu.
Em 2003, o Prof. José Manuel Viegas propôs e obteve autorização para a criação do Doutoramento em Transportes no IST. Mas, ciente das exigências de um tal programa num domínio de espetro tão largo e interdisciplinar, foi co-promotor e o primeiro Diretor-Geral da rede TRANSPORTNET que juntou 8 das principais escolas europeias com programas de investigação avançada em Transportes (EPF Lausanne, Univ. Karisruhe, Univ. Delft, Univ. Lyon 2, Univ. Egeu, Univ. Nápoles, Univ. Antuérpia e IST), para programas de partilha de recursos em unidades curriculares e realização de projetos em comum.
Esta rede ainda funciona atualmente. Entretanto as horas lecionadas em Mestrado já eram creditadas aos docentes e a decisão de incluir a unidade curricular Transportes na licenciatura (e depois no Mestrado Integrado) em Engenharia Civil permitiram ir alargando a equipa do grupo de Vias de Comunicação e Transportes, e criar o Núcleo de Infraestruturas, Sistemas e Políticas de Transportes no CESUR, no qual se conseguiu desde a criação do programa doutoral ter sistematicamente entre 3 e 5 estudantes de doutoramento em paralelo, à época maioritariamente sob sua orientação.
Passou também a haver participação da sua equipa do IST nos projetos de l&D nacionais e da Comissão Europeia. Conseguiu ainda criar as condições para o recrutamento dum Professor Catedrático de Vias de Comunicação (em 2010), lacuna grave do IST desde havia mais de três décadas. Desde a sua ligação aos Sistemas de Transportes, o Prof. José Manuel Viegas orientou mais de 60 teses de Mestrado (pré-Bolonha) e 17 teses de doutoramento. Foi regente de unidades curriculares em cursos de mestrado nas Universidades de Coimbra, Antuérpia, Castilia-la-Mancha e de Duisburg-Essen.
Ao longo deste período, e para além da sua vasta atividade de consultoria (sobretudo na empresa TIS, mas também através do CESUR), teve intervenção pública regular na discussão dos temas polêmicos que iam surgindo, explicitando sempre a sua condição de Professor do Técnico. A sua intervenção terá sido decisiva nos dossiês da Segunda Travessia do Tejo e da mudança da localização do Novo Aeroporto de Lisboa, da Ota para o campo de tiro de Alcochete.
Foi também ao longo dos anos várias vezes consultor do Governo português, em assuntos como a redação da componente Acessibilidade e Transportes do primeiros Planos de Desenvolvimento Regional (após a adesão à Comunidade Econômica Europeia), a preparação da rede de Alta Velocidade Ferroviária, os sistemas tarifários dos transportes públicos nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, os sistemas de portagens nas autoestradas, etc. E foi consultor de várias organizações internacionais, como a Comissão Europeia, o Conselho da Europa, o Banco Mundial, a UITP (União Internacional dos Transportes Públicos) e WBCSD (World Business Council for Sustainable Development).
Em 2011 fez parte do Grupo de Alto Nível convocado pelo Comissário Europeu Siim Kallas para o aconselhar sobre o Futuro do Transporte Rodoviário de Mercadorias na Europa, e em 2015 foi convidado pelo Secretário Geral da ONU, Ban Ki-Moon para integrar o Grupo de Alto Nível que lhe preparou o relatório "Mobilizing Sustainable Transport for Development".
Foi membro do Editorial Board das revistas Transport Policy, Transportation Research C – Emerging Technologies, e International Journal of Transport Economics (entre 1998 e 2016). Assumiu também posições destacadas em várias organizações ligadas à investigação e às políticas de transportes. Algumas das mais relevante, por ordem cronológica, foram:
• Redi Nectar (Fundação Européia de Ciência) - co-presidente do grupo de Política de
Trarisportes, 1986-1994;
• Sociedade para a Conferência Mundial de Investigação em Transportes (WCTRS) – vice-presidente da Comissão Científica (1998-2007); Presidente da Comissão Organizadora da XII Conferência Mundial, em Lisboa, 2010; Presidente da Comissão de Seleção do anfitrião da Conferência de 2016, em 2013.
• EURNEX - Rede de Excelência da investigação ferroviária na União Europeia, co-presidente do
grupo de Estratégia e Política de Transportes (2004-2007);
• Presidente de três mesas redondas da CEMT - Conferência Europeia dos Ministros dos
Transportes, entre 2000 e 2004;
No âmbito do programa MIT-Portugal, o Prof. José Manuel Viegas acabou designado coordenador da área focai "Sistemas de Transportes" após o is ano do programa e foi coordenador do Mestrado em Sistemas Complexos de Infraestrutura de Transporte, tendo liderado a participação das equipas das três universidades (Lisboa, Porto, Coimbra) com reconhecido sucesso. Como um dos resultados desse processo foi aprovado o programa doutorai conjunto das 3 universidades em Sistemas de Transportes, sendo o outro principal resultado um forte aumento do número de doutoramentos e de publicações científicas geradas nas equipas portuguesas participantes.
A primeira 1 ase desse programa durou até 2012, tendo o Prof. José Manuel Viegas em Maio desse ano sido eleito (pelos Ministros de Transportes dos 54 países membros) Secretário-Geral do Fórum Internacional dos Transportes (da OCDE) e deixado por isso as funções que exercia no IST e no programa.
Enquanto secretário-geral do Fórum Internacional dos Transportes (ITF na sigla inglesa), no período entre Agosto de 2012 e Agosto de 2017, o Prof. José Manuel Viegas manteve a atividade de investigação, sendo o responsável pela formulação do sistema de mobilidade partilhada em pequenos veículos em aglomerações urbanas e um dos principais autores do algoritmo de otimização e das publicações do ITF sobre a matéria e que ainda hoje constituem a principal referência mundial nessa temática.
Desenvolveu aí um importante trabalho de reforma institucional, tendo conseguido aprovação (necessariamente unânime de todos os 57 países membros, face aos estatutos) de dossiês críticos como o da revisão da fórmula das contribuições financeiras, da revisão do mandato da instituição, e da aprovação da Carta de Qualidade para o transporte rodoviário de mercadorias no âmbito de todo o espaço europeu (União Europeia e mais 15 países).
Mas foi sobretudo com a sua capacidade de criar e gerir equipas com participantes de diferentes perfis que conseguiu resultados do maior significado, com a criação do "Corporate Partnership Board", um conselho de cerca de 30 empresas do setor transportes e afins, reconhecido como órgão estatutário duma organização intergovernamental, e ainda com a celebração de um conjunto de memorandos de colaboração com múltiplas associações profissionais do setor. Foi sobretudo com estas iniciativas que conseguiu o posicionamento inequívoco do ITF como a instituição internacional de referência para a inovação e a discussão em matéria de política de transportes.
Depois da saída do ITF em 2017 regressou a Lisboa e tem continuado a trabalhar como consultor e como investigador científico, sendo membro investigador a tempo parcial do CERIS. Desta atividade resultou um artigo científico sobre a aplicação de um sistema de reservas para cargas e descargas em meio urbano, publicado com colegas da Universidade de Brescia, Itália, estando em fase adiantada de preparação [um outro de autoria individual sobre o conceito de clubes de carpoollng e a otimização dos seus procedimentos e um pedido de patente no âmbito do transporte ferroviário.
Tem sido desde 2018 o coordenador metodológico global do projeto "Sustainable Mobility for Ali", conduzido por um consórcio de mais de 50 organizações de todo o mundo e ancorado no Banco Mundial, no âmbito do qual desenvolveu e programou um algoritmo (hoje disponível online) para seleção automática de protótipos de planos de mobilidade sustentável para qualquer país.
É ainda presidente do Conselho de Ambiente e Sustentabilidade da EDP e do Conselho Consultivo para a Academia Mass-Transit da SNCF, empresa nacional francesa de caminhos de ferro.
É desde a conclusão da licenciatura membro da Ordem dos Engenheiros, sendo desde 2016 Membro Conselheiro. Foi distinguido em Julho de 2021 pela UITP, a associação mundial dos Transportes Públicos, com o título honorífico de Embaixador Permanente da UITP (um de apenas 10).
Não menos relevante que os resultados individuais alcançados ao longo do seu percurso profissional, é o facto de que esse percurso só foi possível à medida que ele próprio ia construindo o caminho, com a criação, quer das organizações, quer das soluções para assegurar o seu funcionamento eficaz.
Saliente-se ainda o impacto que a sua atividade teve no aumento (desde o zero até a algumas dezenas) do número de investigadores em sistemas de transportes e temas afins nas universidades português, e da qualidade e quantidade da sua produção, bem como a presença de vários ex-alunos do Prof. José Manuel Viegas como professores nas melhores universidades portuguesas e em universidades internacionais de grande qualidade. Trata-se claramente dum caso de "fazer escola", o desígnio mais elevado para qualquer professor.